Post publicado originalmente no BLPM:
Outro dia me perguntaram como fazer para ser autônomo aqui na Espanha, quanto se recolhe de IVA, de IRPF, e se valia a pena. Também tive as mesmas dúvidas ao princípio, e hoje, depois de 6 anos como autônoma, acho que para decidir se compensa ou não, o ideal é pôr todos os detalhes no papel. Logo a decisão vai ser de cada pessoa, de acordo com sua realidade.
Vários temas podem ser abordados, como o empreendedorismo, a ideia, estudo de mercado, planejamento, financiamento. Neste post vamos tratar da parte burocrática, aquela da qual ninguém quer falar, mas todo mundo acaba precisando de detalhes algum dia.
Além do mais, você vai saber como o governo atual incentiva a que mais pessoas sejam autônomas com a tarifa plana.
Decisão de ser ou não autônomo: vantagens e desvantagens
Vantagens
- É a forma mais rápida, simples e econômica de ter um negócio: não é necessário ter investimento inicial e a “sede da empresa” pode ser a sua própria casa. De fato, é assim quase sempre.
- O controle e a gestão do negócio são feitos pelo próprio profissional: não ter chefe direto se traduz em que as decisões são todas de responsabilidade da pessoa, tanto os passos certeiros como os em falso.
- Não é necessário haver um processo prévio de constituição: a pessoa se inscreve hoje mesmo e já pode emitir nota fiscal.
- Tarifa plana nos primeiros 18 meses que a pessoa é autônoma na vida ou que não tenha sido autônomo nos últimos 5 anos.
Desvantagens
- Se o profissional emite nota fiscal a mais de um empregador, sua declaração do IRPF deve ser feita por ele mesmo ou por um contador. Se não tem mais de um empregador, a agência tributária faz o rascunho (borrador em espanhol) da declaração, exatamente igual o que acontece com as pessoas que trabalham contratadas.
- Dificuldade de conseguir crédito bancário devido à instabilidade ou incerteza do faturamento mensal. Se o profissional tem um alto faturamento, ele vai pensar em abrir uma “sociedade limitada” e deixar de ser autônomo. Aí a situação muda.
- Mês que não se trabalha, não se fatura, e não há salario. O profissional tem que ser organizado para não ter que fazer malabarismos nas férias, ou em época de vacas magras. No fim a gente que é autônomo sempre acaba fazendo malabarismos, mas realmente tem que gostar.
- Na linha do anterior: o autônomo pode ser organizado e avisar os clientes, se planejar e tirar 1 semana ou 3 meses de férias, essas sempre serão férias não remuneradas. E, cá pra nós, dói um pouco. Aí você começa a conhecer outros autônomos e vê que é uma situação muito mais normal do que pensava.
Agora, vamos para a parte burocrática.
O que fazer na prática para ser autônomo.
Já decidido se quer ser seu próprio chefe, o que a pessoa tem que fazer é ir à sede da aeat agência tributária, que lhe corresponda, de acordo com o seu código postal.
Levar uma cópia do DNI, e uns 3€ (estou exagerando) para comprar o formulário 036, para dar alta no processo.
Vão perguntar qual é a atividade profissional e eles procuram o número correspondente no sistema. Muito importante: todas as atividades profissionais de autônomos recolhem IVA, exceto professores e artistas.
Confesso que achei estranho chegar num lugar tão moderno e informatizado e preencher um formulário a mão. Mas é assim mesmo, depois de receber o formulário o atendente lhe entrega uma via carimbada, depois uma folha A4 com a confirmação da alta. Confirme os dados direitinho.
Tudo isso pode ser feito via telemática, se a pessoa tiver o DNI eletrônico, o que não era o meu caso quando me cadastrei.
Quando emitir nota fiscal, ou fatura, o profissional tem que declarar o valor bruto menos 15% ou 7% de IRPF (dependendo do caso, o valor é um ou outro). O contratante, ou seja, a empresa que está contratando o serviço será responsável por depositar esses 15% ou 7% numa conta do IRPF a nome do contratado, para posterior confirmação quando for a época da declaração do IRPF, normalmente feita entre princípio de abril até fim de junho.
*Importante: não deixe para última hora para fazer a declaração do IRPF. Normalmente o valor a receber é depositado na sua conta em 15 dias, e se tiver que pagar, eles dão prazo e até parcelam, segundo o valor.
Aproveitando que está na agência tributária, cadastre-se no regime de IVA, caso não seja professor nem artista.
2. Seguridad Social
(Previdência Social no Brasil)
Assim que tiver o documento da agência tributária, o próximo passo é ir até a tesouraria da seguridad social que corresponder, igualmente pelo código postal, e levar esse documento de confirmação de alta, junto com disposição para explicar outra vez sua atividade e escolher quanto quer pagar ao mês para o regime de seguridade social.
Explicando em miúdos: dependendo do valor que o profissional decidir pagar, ele pagará maior ou menor cota mensal. Neste caso não é de acordo com o faturamento, e sim com quanto a pessoa quer contribuir mensalmente para quando ela for se aposentar.
A base mínima é 893,10/mês e a máxima é de 3.642€/mês. Calma, o autônomo paga uma porcentagem dessa base para o governo.
Varia de 26,5 a 29,8%. Pense que se uma pessoa paga sobre a base mínima será uns 265€ aproximadamente.
Isso todos os meses. Se ela der baixa, vai deixar de cotizar, e isso conta lá na frente na aposentadoria. O ruim: esse valor é fixo, tenha faturado 1000 ou 5000€, a cota é fixa. Só muda o IRPF e o IVA no caso de quem recolhe.
Na vida cotidiana não há diferença alguma porque as pessoas que pagam menos são atendidas igualmente pelos hospitais e médicos da saúde pública do país.
TARIFA PLANA NA COMUNIDADE DE MADRI
A dia de hoje, outubro de 2016, o governo estimula que os profissionais sejam autônomos concedendo uma tarifa plana conforme segue:
- Primeiros 6 meses de alta: cota de 50€ mensais.
- Do 7º ao 12º mês: 50% de redução da cota mínima.
- Do 13º ao 18º mês: 30% de redução da cota mínima.
Quais são os quesitos para poder ter essa tarifa?
- Não ter sido autônomo nos 5 anos anteriores.
- Não ser administrador de sociedade mercantil.
- Não ter nunca recebido nenhuma bonificação da seguridad social como autônomo.
Coisa boa, não é? Agora, é super importante estar bem informado ao dar alta, e perguntar sobre a tarifa plana, porque os atendentes nem sempre nos informam de todos os nossos direitos.
Mais informações atualizadas sobre a tarifa plana clique aqui e aqui.
Feito na agência tributária.
Já sabemos que artistas e professores são isentos de recolher o IVA. Ok, mas então quem não é isento, como faz?
Veja bem que digo “recolher” e não pagar IVA.
IVA é um imposto sobre valor agregado, que nada mais é que uma carga fiscal sobre o consumo, ou seja, financiado pelo consumidor. Não é privilégio da Europa, praticamente o mundo inteiro cobra IVA.
Então vamos lá ver como funciona: além de professora, sou tradutora. Um cliente me pede uma tradução e combinamos todos os detalhes. O preço acordado é 100€. Na hora de fazer a nota fiscal eu tenho que declarar na nota que ele tem que recolher 15% de IRPF, certo? Vimos mais acima no post.
O cliente me paga 100€ -15% = 85€.
Além disso, quando eu passo o orçamento, tenho que lhe dizer que serão 100€ brutos + IVA.
Há alguns anos o IVA na Espanha é de 21%. Consultar a agência tributária, pois há diferentes tipos que são de 4% tipo super reduzido, 10% reduzido e 21% tipo geral.
Então a nota fiscal fica assim:
15% de 100€ = 15€
21% de 100€ = 21€
Base “imponible” (ou total bruto) = 100€ menos 15€ mais 21€
100 – 15 = 85
85 + 21 = 106
Total líquido da minha nota fiscal vai ser 106€. É esse valor que o cliente vai me pagar.
O IRPF é algo que eu como profissional tenho que descontar do valor do trabalho. Já o IVA é algo que o cliente paga, eu só repassou ao governo. Por isso não se diz “pagar”, se diz recolher quando se trata da nota fiscal.
Pois bem. Como se declara o IVA?
O IVA é declarado trimestralmente. E no fim do ano se faz um fechamento geral.
Junto as notas fiscais de janeiro, fevereiro e março e declaro entre os dias 1º e 10 de abril. Tenho até o dia 20 para devolver o dinheiro que eu recolhi com as notas fiscais que emiti.
E assim para cada trimestre.
Não é difícil, parece um pouco complicado no começo, mas é bem simples.
Se houver algum mês que o profissional teve algum gasto vinculado à atividade econômica, ele pode apresentar as notas fiscais na hora da declaração do IVA e conseguir algum desconto. Por exemplo, eu como tradutora poderia ter um gasto com um dicionário ou algum material de escritório específico. Isso se declara e se deduz. O melhor é consultar um bom despachante, aqui na Espanha seria um contador ou gestor.
Em resumo
No fim, o profissional só vai dar baixa nesse processo todo se ele for contratado por uma empresa e preferir trabalhar lá período integral. Existe a possibilidade de emitir notas fiscais a mais de uma empresa e ao mesmo tempo ter um contrato de trabalho. Chama-se “pluriactividad”.
A partir daqui é só pôr a mão na massa e emitir a ou as notas fiscais no fim do mês.
A decisão é pessoal, e quanto mais informação o profissional tiver, melhor poderá definir o caminho, se quer ou não ser autônomo. No começo parece complicado, mas não é tanto assim.
Então, o que achou das informações? Foram úteis? Deixe seu comentário, e se tiver algo que acrescentar, bem-vind@!
Um abraço!
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